Zusammenfassung der Ressource
Carlos Drummond de Andrade - E agora, José?
- Primeira estrofe
- "E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, e agora, José? e agora,
você? você que é sem nome, que zomba dos outros, você que faz versos, que ama, protesta? e agora,
José?"
- Começa por colocar uma questão que se repete ao longo de todo o poema, se tornando uma espécie
de refrão e assumindo cada vez mais força: "E agora, José?".
- Esta indagação é o mote e o motor do poema, a procura de um caminho, de um sentido possível.
José, um nome muito comum na língua portuguesa, pode ser entendido como um sujeito coletivo,
metonímia de um povo.
- É um homem banal, "que é sem nome", mas "faz versos", "ama, protesta", existe e resiste na sua vida
trivial. Ao mencionar que este homem é também um poeta, Drummond abre a possibilidade de
identificarmos José com o próprio autor. Coloca também um questionamento muito em voga na
época: para que serve a poesia ou a palavra escrita num tempo de guerra, miséria e destruição?
- Segunda estrofe
- "Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho, já não pode beber, já não pode fumar, cuspir
já não pode, a noite esfriou, o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio, não veio a utopia e
tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou, e agora, José?"
- Reforça a ideia de vazio, de ausência e carência de tudo: está sem "mulher", "discurso" e "carinho".
Também refere que já não pode "beber", "fumar" e "cuspir", como se seus instintos e
comportamentos estivessem sendo vigiados e tolhidos, como se não tivesse liberdade para fazer
aquilo que tem vontade.
- Todos os eventuais escapes, todas as possibilidades de contornar o desespero e a realidade não
chegaram, nem mesmo o sonho, nem mesmo a esperança de um recomeço. Tudo "acabou", "fugiu",
"mofou", como se o tempo deteriorasse todas as coisas boas.
- Quarta estrofe
- "Com a chave na mão quer abrir a porta, não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou; quer
ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora?"
- O sujeito lírico não sabe como agir, não encontra solução face ao desencantamento com a vida, como
se torna visível nos versos "Com a chave na mão / quer abrir a porta, / não existe porta". José não tem
propósito, saída, lugar no mundo.
- Não existe nem mesmo a possibilidade da morte como último recurso. José é obrigado a viver.
- Com os versos "quer ir para Minas, / Minas não há mais", o autor cria outro indício da possível
identificação entre José e Drummond, pois Minas é a sua cidade natal. Já não é possível voltar ao local
de origem, Minas da sua infância já não é igual, não existe mais. Nem o passado é um refúgio.
- Terceira estrofe
- "E agora, José? Sua doce palavra, seu instante de febre, sua gula e jejum, sua biblioteca, sua lavra de
ouro, seu terno de vidro, sua incoerência, seu ódio — e agora?"
- Lista aquilo que é imaterial, próprio do sujeito ("sua doce palavra", "seu instante de febre", "sua gula e
jejum", "sua incoerência", "seu ódio") e, em oposição direta, aquilo que é material e palpável ("sua
biblioteca", "sua lavra de ouro", "seu terno de vidro"). Nada permaneceu, nada restou, sobrou apenas a
pergunta incansável: "E agora, José?".
- Quinta estrofe
- "Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse a valsa vienense, se você dormisse, se você
cansasse, se você morresse... Mas você não morre, você é duro, José!"
- Coloca hipóteses, através de formas verbais no pretérito imperfeito do subjuntivo, de possíveis
escapatórias ou distrações ( "gritasse", "gemesse", "tocasse a valsa vienense", "morresse") que nunca
se concretizam, são interrompidas, ficam em suspenso, o que é marcado pelo uso das reticências.
- Mais uma vez, é destacada a ideia de que nem mesmo a morte é uma resolução plausível, nos versos:
"Mas você não morre / Você é duro, José!". O reconhecimento da própria força, a resiliência e a
capacidade de sobreviver parecem fazer parte da natureza deste sujeito, para quem desistir da vida
não pode ser opção.
- Sexta estrofe
- "Sozinho no escuro qual bicho-do-mato, sem teogonia, sem parede nua para se encostar, sem cavalo
preto que fuja a galope, você marcha, José! José, para onde?"
- É evidente o seu isolamento total; não há Deus, não existe fé nem auxílio divino; sem o apoio de nada
nem de ninguém; sem nenhum meio de fugir da situação em que se encontra
- Ainda assim, "você marcha, José!". O poema termina com uma nova questão: "José, para onde?". O
autor explicita a noção de que este indivíduo segue em frente, mesmo sem saber com que objetivo ou
em que direção, apenas podendo contar consigo mesmo, com o seu próprio corpo.
- O verbo "marchar", uma das últimas imagens que Drummond imprime no poema, parece ser muito
significativo na própria composição, pelo movimento repetitivo, quase automático. José é um homem
preso à sua rotina, às suas obrigações, afogado em questões existenciais que o angustiam. Faz parte
da máquina.
- Mesmo assim, e perante uma mundividência pessimista, de vazio existencial, os versos finais do
poema podem surgir como um vestígio de luz, uma réstia de esperança ou, pelo menos, de força: José
não sabe para onde vai, qual o seu destino ou lugar no mundo, mas "marcha", segue, sobrevive,
resiste.
- Contexto histórico
- Em 1942, em plena Segunda Guerra Mundial, o Brasil também tinha entrado num regime ditatorial, o
Estado Novo de Getúlio Vargas. O clima era de medo, repressão política, incerteza perante o futuro. O
espírito da época transparece, conferindo preocupações políticas ao poema e expressando as
inquietações cotidianas do povo brasileiro. Também as condições de trabalho precárias, a
modernização das indústrias e a necessidade de migrar para as metrópoles tornavam a vida do
brasileiro comum numa luta constante.
- Em 1942, data de publicação do poema, Drummond estava de acordo com o espírito da época,
produzindo uma poesia política que expressava as dificuldades diárias do brasileiro comum e as suas
dúvidas e angústias, assim como a solidão do homem do interior perdido na cidade grande.