Psicanálise Musical Público

Psicanálise Musical

Vinicius Macia
Curso por Vinicius Macia, atualizado more than 1 year ago Colaboradores

Descrição

Psicanálise musical. O que é isso? Como aplicar? Como utilizar a música em sessões de psicanálise? Como se dão as técnicas de psicanálise musical? É o que veremos neste curso, que inaugura a área de psicanálise musical

Informações do módulo

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Contexto

Olá, neste primeiro módulo teremos uma breve introdução ao conceito de psicanálise musical, que consiste em um paralelo entre as obras psicanalíticas e as obras de psicologia da música, aplicadas e muito bem sucedidas em sala de aula.Para ser um bom psicanalista musical, é fundamental que, além de conhecer música a fundo, conheça os fundamentos que regem a educação musical, além do estudo óbvio das teorias psicanalíticas.Ah...o inconsciente...tanto a falar sobre ele... Tanto que ele tem a nos falar... Os comportamentos musicais, em si, tem condições de revelar facetas ocultas da mente humana... na conduta musical emergem sintomas do conteúdo inconsciente...traumas, recalques, denegações, foraclusões..tudo é produzido...pessoas com o emocional aflito ou mesmo levemente desviado tendem a procurar aulas de música.... é quase que o mesmo movimento de quem vai à psicanálise..um movimento de quem quer colocar tudo de si pra fora, não apenas como forma de expressão, mas como forma de auto-conhecimento. A psicanálise musical promove o auto-conhecimento através da música, que é uma forma de expressão privilegiada, por estar intimamente conectada com todos os campos da mente humana. FIGURA:https://drive.google.com/file/d/0B0g5HdbU2HdIOTg3NXFtYTVOOEk/view?usp=sharing - Reflita sobre a figura
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Contexto

Sigmund Freud. O pai da psicanálise. O que ele pensava sobre o inconsciente?Para Freud o inconsciente nasce na infância, e nele se armazenam coisas de que a mente afasta de si... acessar o inconsciente é o foco da psicanálise..nós, para isso, utilizaremos do canal musical e da conduta musical.
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Contexto

Este vídeo não foi feito especialmente para o programa deste curso, e sim para um programa de Filosofia da Música. Porém, percebam a relação  interessante que ele estabelece com a psicologia da música..perceba as relações criadas entre o significado musical e a psique humana. Será de extrema valia que você assista a este vídeo, para, agora, aprofundarmos um pouco os estudos no trabalho de Violeta Gainza, que aprofunda a exploração do canal musical e da conduta musical.
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https://books.google.com.br/books?id=kXuIxOBl7IsC&pg=PA77&lpg=PA77&dq=Perturba%C3%A7%C3%B5es+no+canal+musical&source=bl&ots=cvDTvWitYb&sig=9YH2eYwqTVzERKqmXEQOML-77Cw&hl=pt-BR&sa=X&ved=0ahUKEwjSs-3u8MfUAhVKGJAKHR0bBd8Q6AEIJzAA#v=onepage&q=Perturba%C3%A7%C3%B5es%20no%20canal%20musical&f=false   Antes de tudo, peço que acessem o link acima e leiam: O texto introdutório do artigo: Perturbações do Canal Musical dos Músicos O subtítulo "Características comuns aos sujeitos
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Psicologia Analítica foi o nome escolhido por JUNG para abarcar todo o seu sistema teórico. É uma obra ampla e tem raízes profundas. Abordaremos, aqui, portanto, apenas os conceitos que ajudarão a elucidar este trabalho. O que nos chama a atenção, ao contatarmos a obra de Jung, é que os termos ou nomes adotados por ele, para discriminar seus conceitos, têm perfeita conexão com o fato ou com o aspecto analisado em si. Não são termos inventados ao acaso e que nada significam, mas sim termos que carregam e explicam o seu próprio conteúdo. Jung foi sujeito de suas própria experiências no que se refere à investigação do inconsciente.  Tudo o que ocorria com ele, incluindo os sonhos, fantasias, intuições, etc., que para a maioria das pessoas passaria despercebido, era para Jung uma fonte de pesquisa e análise.  Homem extremamente intuitivo, sempre se interessou pelos fenômenos psíquicos. Foi médico e psiquiatra; nasceu na cidade de Keswill, na Suíça em 26/07/1875 e viveu até 06/06/1961. Conviveu com Bleuler, Adler, Freud e outros grandes nomes da psiquiatria.  Fora da área médica, Jung manteve contatos e trocou idéias com grandes gênios como Einstein, Pauli, e outros.  Estudou profundamente os grandes filósofos como Schopenhauer, Nitzsche e  Kant. Foi buscar lastro para suas idéias na Alquimia, na Mitologia, nos povos primitivos da Ásia, África e Índios Pueblos da América do Norte.  Visitou, entre tantos lugares,  a Índia em busca de respostas para suas dúvidas mais íntimas. Filho de religiosos, seu pai era pastor luterano, desde cedo teve contato com a idéia de um Deus e bem cedo começou o questionamento sobre a origem e a finalidade da vida humana, perguntas para as quais não obteve resposta através de seu pai, nem tão pouco nos livros religiosos e escritos da época. Jung aproximou-se da filosofia e religiões orientais, conheceu e estudou o I Ching e encontrou ressonância nos simbolismos destas culturas na compreensão do desenvolvimento humano. Introduziu uma nova maneira de praticar a psicologia clínica, uma nova visão de mundo e do homem.  Salientava, sempre que tinha oportunidade, que o homem deveria ser visto por inteiro, ou seja, como um todo; pertencente a uma comunidade, num determinado momento, não poderia, portanto, ser visto, dissociado do seu contexto social, cultural e universal. Quando Jung manteve contato com a obra de Freud, ficou tão entusiasmado com o trabalho deste outro gênio que não tardou em conhecê-lo. A admiração foi mútua, Freud também gostou do jovem Suíço e logo fez dele um dos difusores de suas idéias. O “casamento”, porém,  durou pouco. Jung mostrava-se inquieto com algumas posições de Freud a respeito, principalmente, da teoria da libido.  Freud, por sua vez, não admitia ver a sua teoria por outro ângulo, não dava abertura para outras interpretações diferentes das dele. Jung não aceitava as insistências de Freud, de que as causas dos conflitos psíquicos envolveriam algum trauma sempre de natureza sexual.  Freud, por outro lado, não admitia o interesse de Jung pelos fenômenos espirituais como fontes válidas de estudo em si. O rompimento entre os dois causou profundas mágoas para ambos os lados. Mágoas que, até hoje, notam-se entre os seguidores de ambos.  Não é raro deparamos com críticas sobre um ou outro nos jornais, ou obras literárias ironizando um dos dois. O rompimento de Jung com Freud, entretanto, acaba por trazer ao mundo um grande benefício.  Jung teve que alçar vôo sozinho em busca de respostas para si mesmo e, de certa forma, para provar que suas idéias eram válidas e as de Freud tinham valores parciais, mergulhou no mais profundo de sua alma, conectou-se com seu inconsciente e buscou lá inspiração e coragem parar mudar a face da psicologia. O ponto crucial do desentendimento entre os dois gênios foi ponto de partida para Jung.  Enquanto a teoria de Freud busca as causas, a de Jung busca a direção, a finalidade.  Enquanto para Freud a libido é somente sexual, para Jung a libido é toda a energia psíquica.  Nise da Silveira, descreve libido da seguinte maneira: “Libido é apetite, é instinto permanente de vida que se manifesta pela fome, sede, sexualidade, agressividade, necessidades e interesses diversos. Tudo isso está compreendido no conceito de libido. A idéia Junguiana de libido aproxima-se bastante da concepção de vontade, segundo Schopenhauer. Entretanto Jung não chegou a essa formulação através dos caminhos da reflexão filosófica. Foi a ela conduzido pela observação empírica, no seu trabalho de médico psiquiatra. Uma das maiores preocupações de Jung era a de sempre manter um “pé” na ciência, buscava sempre comprovar suas idéias, pois além de confrontar-se com as idéias do principal nome de então, Freud, tinha que se confrontar com a existente e crescente racionalidade da época. O conceito de inconsciente também difere de Freud para Jung.  Para Freud, o inconsciente é um depósito de rejeitos do consciente, isento de movimento e estático, se forma, portanto, a partir do consciente.  Para Jung o inconsciente existe “a priori”. O ser humano nasce inconsciente e traz com ele muitos conteúdos herdados dos ancestrais.  Assim, o inconsciente existe “antes”, é pré-existente ao consciente.  Segundo Nise da Silveira, “Pode-se representar a psique como um vasto oceano (inconsciente) no qual emerge pequena ilha (consciente).” Para Jung, o inconsciente não é estático e rígido formado pelos conteúdos que são reprimidos pelo ego. Ao contrário, o inconsciente é dinâmico, produz conteúdos, reagrupa os já existentes e trabalha numa relação compensatória e complementar com o consciente.  No inconsciente encontram-se, em movimento, conteúdos pessoais, adquiridos durante a vida e mais as produções do próprio inconsciente. Jung classificou o inconsciente em Inconsciente Pessoal (ou Individual) e Inconsciente Coletivo.  O  Inconsciente Pessoal ou Individual é aquela camada mais superficial de conteúdos, cujo marco divisório com o consciente não é tão rígido.  É uma camada de conteúdos que se acha contígua ao consciente.  Estes conteúdos subjazem no inconsciente por não possuírem carga energética suficiente para emergir na consciência.  Correspondem àqueles aspectos que em algum momento do desenvolvimento da personalidade não foram compatíveis com as tendências da consciência e foram, portanto reprimidas.  Também estão, no inconsciente pessoal, percepções subliminares, ou seja, aquelas que foram captadas pelos nossos sentidos de forma subliminar, que nem nos demos conta de termos contato com o fato em si.  Conteúdos da memória que não necessitam estar presentes constantemente na consciência estão presentes no inconsciente pessoal. Todos estes conteúdos formam no Inconsciente Pessoal um grande banco de dados que poderão surgir na consciência a qualquer momento. Outros importantes conteúdos estão no inconsciente pessoal; são os complexos.  Os complexos são conteúdos de extrema importância para a vida psíquica e estaremos abordando-os no decorrer do trabalho.  A grande descoberta de Jung foi o Inconsciente Coletivo. Segundo ele, o inconsciente coletivo é a camada mais profunda da psique e constitui-se dos materiais que foram herdados da humanidade.  É nesta camada que existem os traços funcionais como se fosses imagens virtuais, comuns a todos os seres humanas e prontas para serem concretizadas através das experiências reais.  É nessa camada do inconsciente que todos os humanos são iguais. A existência do inconsciente coletivo não depende de experiências individuais, como é o caso do inconsciente pessoal, porém, seu conteúdo precisa das experiências reais para expressar-se, já que são predisposições latentes. Jung chamou de arquétipos a estes traços funcionais do inconsciente coletivo.  Salienta  ele: “ Existem tantos arquétipos quantas as situações típicas da vida. Uma repetição infinita gravou estas experiências em nossa constituição psíquica, não sob a forma de imagens saturadas de conteúdo, mas a princípio somente como formas sem conteúdo que representavam apenas a possibilidade de um certo tipo de percepção e de ação.” Os arquétipos não são observáveis em si, só podemos percebe-los através das imagens que ele proporciona. Continua Jung: “ “Imagens” expressam não só a forma da atividade a ser exercida, mas também, simultaneamente, a situação típica no qual se desencadeia a atividade. Tais imagens são “imagens primordiais”, uma vez que são peculiares à espécie, e se alguma vez foram “criadas”, a sua criação coincide no mínimo com o início da espécie. O típico humano do homem é a forma especificamente humana de suas atividades. O típico específico já está contido no germe. A idéia de que ele não é herdado, mas criado de novo em cada ser humano, seria tão absurda quanto a concepção primitiva de que o Sol que nasce pela manhã é diferente daquele que se pôs na véspera.” Jung salienta que o mérito da observação de que os arquétipos existem não pertence a ele e sim a PLATÃO, com seu pensamento “de que a idéia é preexistente e supra-ordenada aos fenômenos em geral.” Outros pensadores como ADOLF Bastian, evidenciam a ocorrência de certas “idéias primordiais...” e outros, mais tarde, como DÜRKHEIM, HUBERT e MAUSS “que falam de “categorias” próprias da fantasia” e ainda Hermam USENER que reconhece “a pré-formação inconsciente na figura de um pensamento inconsciente” A contribuição de Jung se dá, entretanto, nas provas obtidas por ele, que os arquétipos existem e aparecem sem influência de captação externa.  De acordo com Jung esta constatação “significa nada menos do que a presença, em cada psique, de disposições vivas inconscientes, e, nem por isso menos ativas, de formas ou idéias em sentido platônico que instintivamente pré-formam e influenciam seu pensar, sentir e agir.” Alguns arquétipos foram amplamente enfatizados por Jung, pois permeiam o desenvolvimento da personalidade e invariavelmente estão bem próximo de nós, no nosso dia-a-dia e são mobilizados, pela psique, tão logo surja uma situação típica.  Falaremos sobre cada um deles a seguir, a exceção do Arquétipo materno que será abordado no capítulo III. Com o desenvolvimento da consciência, o ser humano, que é gregário por natureza, necessita desenvolver algumas características básicas para a adaptação social em contraste com seus instintos animalescos.  É a persona o arquétipo desta adaptação. O nome vem da antiga máscara usada no teatro grego para representar esse ou aquele papel numa peça e tem, para Jung, o mesmo sentido, ou seja; persona é a máscara ou fachada aparente do indivíduo exibida de maneira a facilitar a comunicação com o seu mundo externo, com a sociedade onde vive e de acordo com os papéis dele exigidos.  O objetivo principal é o de ser aceito pelo grupo social a que pertence.  A persona é muito importante, na medida em que dependemos dela em nossos relacionamentos diários, no trabalho, na roda de amigos ou na convivência com o nosso grupo. Como qualquer outro componente psíquico, a persona possui um lado benéfico e outro maléfico.  Em seus aspectos benéficos, a persona auxilia a convivência em sociedade, extremamente importante em nossos atuais dias. Também transmite uma certa sensação de segurança, na medida em que cada um desempenha exatamente o papel dele esperado, da melhor forma possível.  Assim, espera-se de um médico que se comporte como tal, que atenda o paciente e que o cure dos males que o atingem. De um bombeiro, que seja solícito e enfrente, sem grandes medos os incêndios, e assim por diante. No sentido nefasto da persona, há o perigo de o indivíduo identificar-se com o papel por ele desempenhado fazendo com que a pessoa se distancie de sua própria natureza.  Um médico, por exemplo, não é médico o tempo todo. Em casa é o pai, o marido, o filho e assim outras máscaras ele estará utilizando.  Aqueles que são possuídos por sua persona, tornam-se pessoas difíceis de conviver, são rígidos em sua persona e exigem dos demais que se comportem igual a ele. A persona serve também como proteção contra nossas características internas as quais achamos que nos desabonam e, portanto, queremos esconder. Como a psique possui uma dinâmica de compensação energética entre os seus conteúdos, podemos entender que, em uma super valorização da persona, haverá, internamente, uma forte tendência à compensação através de outros arquétipos, são eles:  sombra e anima/animus. Sendo a persona a face externa da psique, a face interna, a formar o equilíbrio são os arquétipos da anima e animus.  O arquétipo da anima, constitui o lado feminino no homem, e o arquétipo do animus constitui o lado masculino na psique da mulher.  Ambos os sexos possuem aspectos do sexo oposto, não só biologicamente, através dos hormônios e genes, como também, psicologicamente através de sentimentos e atitudes. O homem traz consigo, como herança, a imagem de mulher. Não a imagem de uma ou de outra mulher especificamente, mas sim uma imagem arquetípica, ou seja, formada ao longo da existência humana e sedimentada através das experiências masculinas com o sexo oposto. Cada mulher, por sua vez, desenvolveu seu arquétipo de animus através das experiências com o homem durante toda a evolução da humanidade. Embora, anima e animus desempenhem função semelhante no homem e na mulher, não são, entretanto, o oposto exato. Segundo Humbert, “Anima e animus não são simétricos, têm seus efeitos próprios: possessão pelos humores para a anima inconsciente, pelas opiniões para o animus inconsciente.”[8] A anima, quando em estado inconsciente pode fazer com que o homem, numa possessão extrema, tenha comportamento tipicamente feminino, como alterações repentinas de humor, falta de controle emocional. Em seu aspecto positivo a anima, quando reconhecida e integrada à consciência, servirá como guia e despertará, no homem o desejo de união e de vínculo com o feminino e com a vida.  A anima será a “mensageira do inconsciente” tal como o deus Hermes da mitologia Grega. A valorização social do comportamento viril no homem, desde criança, e o desencorajamento do comportamento mais agressivo nas mulheres, poderá provocar uma anima ou animus subdesenvolvidos e potencialmente carregados de energia, atuando no inconsciente. Um animus atuando totalmente inconsciente poderá se manifestar de maneira também negativa, provocando alterações no comportamento e sentimentos da mulher.  Segundo Jung: “em sua primeira forma inconsciente o animus é uma instância que engendra opiniões espontâneas, não premeditadas; exerce influência dominante sobre a vida emocional da mulher.” O animus e a anima devidamente reconhecidos e integrados ao ego, contribuirão para a maturidade do psiquismo. Jung salienta que o trabalho de integração da anima é tarefa difícil. Diz ele: “Se o confronto com a sombra é obra do aprendiz, o confronto com a anima é obra-prima. A relação com a anima é outro teste de coragem, uma prova de fogo para as forças espirituais e morais do homem. Jamais devemos esquecer que, em se tratando da anima, estamos lidando com realidades psíquicas, as quais até então nunca foram apropriadas pelo homem, uma vez que se mantinham foram de seu âmbito psíquico, sob a forma de projeções.” Anima e animus são responsáveis pelas qualidades das relações com pessoas do sexo oposto.  Enquanto inconscientes, o contato com estes arquétipos são feitos em forma de projeções. O homem, quando se apaixona por uma mulher, está projetando a imagem da mulher que ele tem internalizada.  É fato que a pessoa que recebe a projeção é portadora, como dizia Jung, de um “gancho” que a aceita perfeitamente.  O ato de apaixonar-se e decepcionar-se, nada mais é do que projeção e retirada da projeção do objeto externo.  Geralmente o que se ouve é que a pessoa amada deixou de ser aquela por quem ele se apaixonou, quando na verdade ela nunca foi, só serviu como suporte da projeção de seus próprios conteúdos internos. Para o homem a mãe é o primeiro “gancho” a receber a  projeção da anima, ainda quando menino, o que se dá inconscientemente.  Depois, com o crescimento e sua saída do ninho, o filho vai, aos poucos, retirando esta projeção e lançando-a a outras mulheres que continua sendo um processo inconsciente.  A qualidade, do relacionamento mãe-filho, será essencial e determinará a qualidade dos próximos relacionamentos, com outras mulheres. Salienta Jung:  “Para o filho, a anima oculta-se no poder dominador da mãe e a ligação sentimental com ela dura às vezes a vida inteira, prejudicando gravemente o destino do homem ou, inversamente, animando a sua coragem para os atos mais arrojados.” Outros aspectos do relacionamento mãe-filho serão analisados no capítulo subseqüente. Jung define projeção da seguinte forma: “ a projeção é um processo inconsciente automático, através do qual um conteúdo inconsciente para o sujeito é transferido para um objeto, fazendo com que este conteúdo pareça pertencer ao objeto.  A projeção cessa no momento em que se torna consciente, isto é, ao ser constatado que o conteúdo pertence ao sujeito.”  Enquanto a anima ou animus, projeta-se no sexo oposto, determinando a qualidade das relações entre os sexos, a sombra influirá nas relações com pessoas do mesmo sexo. A sombra apresenta-se como o mais poderoso de todos os arquétipos, já que é a fonte de tudo o que existe de melhor e de pior no ser humano.  Como todo e qualquer elemento psíquico, a sombra possui aspectos positivos e negativos para o desenvolvimento da personalidade. Se a persona é desenvolvida com o objetivo de facilitar a convivência do homem na sociedade onde vive, onde, então, se apresentarão aqueles conteúdos não compatíveis com esta adaptação?  A sombra é o arquétipo receptáculo dos aspectos que foram suprimidos no desenvolvimento da persona, e mais que isto, ela contém conteúdos que nem chegaram a passar pelo crivo do consciente. Estes conteúdos podem, potencialmente, emergir a qualquer momento na consciência, se considerados do ponto de vista energético. Quanto mais unilateral se torna o consciente; tanto mais a persona é banhada de purpurina e mais acentuados são os elementos que compõem a sombra.  Importante salientar, no entanto, que a sombra não é o lado oposto da consciência, mas representa o que falta a cada personalidade consciente. Um dos maiores trabalhos no processo de individuação, que consiste no desenvolvimento da personalidade total,  é sem dúvida a integração da sombra na consciência.  Uma vez reconhecida, a sombra, como parte de si mesmo, o ser humano irá fazê-lo constantemente, pois os conteúdos sombrios não se esgotam, porque sempre que houver processo de escolha, consciente, haverá também, o lado que ficou negligenciado ou não escolhido, aquele que poderia ter sido vivido e não foi.  Neste sentido, a sombra estará sempre ao lado do indivíduo e focaliza o resultado de suas escolhas. Normalmente, reconhecer a sombra implica em “arrumar encrenca” e colocar em questionamento toda a consciência de si: os hábitos, crenças, valores, afetividade, etc. É um mergulho no desconhecido, é ficar sem chão, é perder o apoio. Sendo o confronto com a sombra um dos primeiros aspectos do processo de individuação, é necessário um ego bem estruturado para reconhecer que tudo aquilo que projetamos nos outros, principalmente as coisas que menos gostamos, são nossas e de mais ninguém. Se você estiver interessado em Psicologia, Liderança e Motivação, visite o Portal da Psique. A sombra não possui, porém, somente aspectos negativos e rejeitados. Possui também aspectos que impulsionam o ser humano para a criatividade e busca de soluções, quando os recursos conscientes se esgotaram. Por sorte, a sombra é insistente e não se sente acuada com a repressão exercida pela consciência. Sempre arranja um jeito de se manifestar, a inspiração é uma destas maneiras. Uma vida sem a presença da sombra torna-se sem brilho e sem criatividade.  Quando, para a nossa adaptação social, desenvolvemos a persona, somos obrigados a descartar vários aspectos que não condizem com a atitude da consciência naquele momento.  Estes aspectos poderão ser úteis em outra época de nossas vidas, poderão voltar, uma vez que não serão mais prejudiciais à nossa adaptação e poderão mudar o rumo de nossa história. A sombra, quando trabalha em harmonia com o ego, deixa a vida mais colorida e rica. Jung mergulhava em seu próprio inconsciente e trazia à luz, aspectos que o ajudavam a entender o seu mundo e de seus pacientes.  Muitas vezes observou, nos sonhos e fantasias dos pacientes e nas suas próprias fantasias, que os temas eram recorrentes, cujas diferenças ficavam a cargo das experiências individuais de cada um, mas o cerne do tema era o mesmo.  Ao estudar mitologia entendeu que o mito é uma projeção do inconsciente coletivo e refez a história de muitos deuses e heróis da mitologia através de uma visão psicológica.  Viu no mito uma forma de expressão do inconsciente e passou a utilizá-los no entendimento de suas própria fantasias e sonhos, como também de seus pacientes. A grande busca de Jung consistia em conhecer a si mesmo e o significado da vida.  Em suas pesquisas, percebeu que a psique trilha um único objetivo, que é o encontro com seu próprio centro, a unicidade, é o retorno do ego às suas origens.  Deu então a esse objetivo da vida psíquica o nome de Individuação, que não é repentino, mas sim, se apresenta como um processo. A motivação para a individuação é inata, porém o processo, em si, só se dá no confronto do consciente com o inconsciente, o que resulta num amadurecimento dos componentes da personalidade e na união destes numa síntese, como também na realização de um indivíduo único e inteiro. O processo de individuação é o eixo da psicologia Junguiana.  É através dele que a pessoa vai se conhecendo, retirando suas máscaras, retirando as projeções lançadas anteriormente no mundo externo e integrando-as a si mesmo.  Não se trata de um processo fácil e simples, nem tampouco ocorre linearmente.  É um processo doloroso, difícil e ocorre em um movimento circunvolutório direcionado a um novo centro psíquico, o Self. O Self é o centro de toda a personalidade.  Dele emana todo o potencial energético de que a psique dispõe. É o ordenador dos processos psíquicos. Conforme Hall observa “O Self é o principal arquétipo do inconsciente coletivo, assim como o sol é o centro do sistema solar. O Self é o arquétipo da ordem, da organização e da unificação; atrai a si e harmoniza os demais arquétipos e suas atuações nos complexos e na consciência, une a personalidade, conferindo-lhe um senso de “unidade” e firmeza.” O objetivo de toda personalidade é chegar ao autoconhecimento que é conhecer o próprio Self. Jung conceituou o Self da seguinte forma:  “O Self representa o objetivo do homem inteiro, a saber, a realização de sua totalidade e de sua individualidade, com ou contra sua vontade. A dinâmica desse processo é o instinto, que vigia para que tudo o que pertence a uma vida individual figure ali, exatamente, com ou sem a concordância do sujeito, quer tenha consciência do que acontece, quer não.” Jung buscou na Alquimia o respaldo para, de certo modo, validar sua teoria da individuação.  Percebeu que o aspecto simbólico da alquimia representa o processo de individuação, onde o alquimista busca, através de etapas, encontrar o ouro. Não se trata, entretanto, do ouro enquanto metal precioso, porém de sua simbologia enquanto preciosidade, numinosidade. Jung reconhece que a individuação, embora seja um impulso inato, só é possível quando da participação do ego, formando o eixo ego-Self, um depende do outro.  O ego é a maneira que a consciência tem de tomar conhecimento do Self e sem este conhecimento não haverá integração de conteúdos inconscientes, nem tão pouco individuação como uma “expansão da consciência”. Enquanto Jung trabalhava no hospital de Burgholzli, em 1900, organizou um laboratório experimental de psicopatologia com o objetivo de investigar reações psíquicas, através de um teste desenvolvido por ele; “Teste de Associação de Palavras”.  Os resultados deste teste levaram Jung a formular, mais tarde, a teoria dos complexos. Para Jung os complexos são os caminhos que nos permite chegar ao inconsciente.  “A via regia que nos leva ao inconsciente, entretanto, não são os sonhos, como ele [Freud] pensava, mas os complexos, responsáveis pelos sonhos e sintomas.” Portadores de uma carga energética substancial, os complexos têm como núcleo o arquétipo e, em torno deste núcleo vão se concentrando idéias ou pensamentos cheios de afetividade.  Estruturam-se como entidades autônomas quando uma parte da psique for cindida por causa de um trauma, um choque emocional ou um conflito moral.  Quando totalmente inconscientes atuam livremente e podem tomar o ego.  Geralmente, aquelas situações em que ocorrem alterações da consciência e também comportamentais, sem motivo aparente, são manifestações da possessão do complexo sobre o ego. Jung salienta que pode se dizer dos complexos em termos científicos, o seguinte; “...o complexo emocionalmente carregado é a imagem de uma determinada situação psíquica com uma carga emocional intensa que se mostra, assim, incompatível com a habitual disposição ou atitude da consciência. Essa imagem é dotada de certa coesão interna, possui sua própria totalidade e dispõe, ainda, de um grau relativamente alto de autonomia. Isto é, está muito pouco sujeita às disposições da consciência e, por isso, comporta-se na esfera da consciência como um corpus alienum (corpo alheio) cheio de vida...” Os complexos não são em si negativos, seus efeitos, no entanto, poderão ser.  Porém como são nós de energia que possibilitam a movimentação da psique acabam por se tornarem grandes aliados que impulsionam o ser humano para o desenvolvimento psíquico. Podemos superar um complexo vivendo-o intensamente e compreendendo o papel que exercem nos padrões de comportamento e nas reações emocionais.  No seu sentido positivo, os complexos poderão ser uma fonte de inspiração para futuras realizações.  Von Franz descreve os complexos da seguinte maneira:  “Os complexos são os motores da psique. São como diferentes núcleos, que impulsionam e vitalizam a psique. Se não tivéssemos complexos, estaríamos mortos.” Não existe um número fechado de complexos sobre os quais poderíamos discorrer, porém existem aqueles que, pela sua constelação mais freqüente, são mais fáceis de serem analisados, como o complexo materno, o complexo paterno, o complexo de poder, o complexo de inferioridade, o de superioridade, etc. Para Jung, o Ego é um complexo; o “complexo do ego”.  Diz ele, sobre o Ego: “É um dado complexo formado primeiramente por uma percepção geral de nosso corpo e existência e, a seguir, pelos registros de nossa memória. Todos temos uma certa idéia de já termos existido, quer dizer, de nossa vida em épocas passadas; todos acumulamos uma longa série de recordações. Esses dois fatores são os principais componentes do ego, que nos possibilitam considerá-lo como um complexo de fatos psíquicos.” O complexo do ego, entretanto, é diferente dos outros complexos, porque se impõe como centro da consciência e atrai para si os demais conteúdos conscientes, visa também, mais do que outro complexo, a totalidade. Embora a psique seja composta de estruturas bastante diversas, muitas vezes se opondo umas às outras, existe entre elas uma forte interação que poderão se dar de três formas.  Uma estrutura pode compensar a fraqueza da outra, um componente pode se contrapor a outro, e duas ou mais estruturas podem se unir formando uma síntese.  A compensação pode se dar, por exemplo, entre o ego e a anima de um homem, assim como o ego e o animus de uma mulher.  O ego normal do homem é masculino enquanto a anima é feminina e na mulher sendo o ego feminino o animus é masculino.  Assim, uma masculinidade exacerbada num homem pode estar mostrando um inconsciente frágil, delicado e sensível, neste caso o inconsciente atua de maneira compensatória proporcionando uma espécie de equilíbrio entre os elementos contrastantes, evitando uma desintegração da psique. As tensões oriundas dos conflitos entre as instâncias da psique são inevitáveis e imprescindíveis, pois, são elas que constituem a própria essência da vida.   Os conflitos existem porque existem oposições em qualquer parte da personalidade e o ego deve atender às exigências externas da sociedade e as exigências internas do inconsciente coletivo.  Jung achava que sempre era possível haver uma união dos contrários e com isso surgir um terceiro elemento da síntese dos dois numa função que ele chamou de função transcendente. Segundo Hall,   “Essa função é dotada da capacidade de unir todas as tendências contrárias da personalidade e de trabalhar para que se atinja a meta da totalidade.” Os conceitos apresentados neste capítulo constituem os princípios básicos da Psicologia Analítica na qual me oriento para a execução deste trabalho.  A teoria Junguiana da personalidade humana é muito mais ampla do que o aqui exposto e vale a pena ser estudada mais profundamente, entretanto, os conteúdos aqui considerados são suficientes para o desenvolvimento do trabalho. Vanilde Gerolim Portillo - Psicóloga Clínica- Pós-Graduada e Especialista Junguiana CRP 06/16672
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O inconsciente e a música na educação musical   Modalidade: Pesquisa concluída Categoria: Fundamentos da educação musical   Vinicius Aparecido da Silva Macia Universidade Vale do Rio Verde (Unincor) viniciusaparecidodasilva@gmail.com       Resumo: As teorias psicanalíticas vêm sendo utilizadas nas diversas áreas do saber humano, com resultados apreciáveis. Neste trabalho é proposta uma investigação entre relações do inconsciente humano e a expressão musical em sala de aula, à luz das teorias psicanalíticas, tendo por objetivo adicionar à prática pedagógica em música a possibilidade de trabalhar-se com a investigação do inconsciente enquanto gerador de deficiências no canal musical. Palavras-chave: Inconsciente, Canal Musical, Psicologia da Música.   1.Introdução Fazer e fruir música, em todos os aspectos que abarcam estes conceitos significa, antes de mais nada, transformar materiais sonoros em estruturas expressivas significativas, no âmbito da forma (SWANWICK, 2003). Esta transformação não ocorre senão dentro do próprio indivíduo, que elabora em si a transposição dos sons propriamente ditos em música. Em outras palavras, a música não existe senão dentro no ser humano. Neste sentido, faz-se necessário que a área que pretende perpetuá-la como arte para as futuras gerações, a educação musical, esteja constantemente debruçada sobre os problemas da psique humana. Dentre as ínumeras implicações desta reflexão, uma delas parece não ser tão contemplada quanto deveria ou poderia: a questão do inconsciente enquanto influenciador da expressão musical. Este trabalho tem por objetivo discutir as principais implicações de se considerar a existência do inconsciente e sua influência na música para a educação musical de um modo geral. Para que seja compreendida a dimensão da música na mente humana, no terreno do inconsciente, é necessário que se estabeleçam alguns paralelos entre a literatura em educação musical, a literatura psicanalítica e a prática da docência em música.   2.O canal musical e o inconsciente Gainza (1988) nos abre extensa reflexão teórico/prática acerca do canal musical, que entendemos como um canal psicológico, ou em termos mais concretos, psicoauditivo, por onde toda a expressão musical caminha. Tal canal funciona como uma via de duas mãos por onde fluem tanto a recepção quanto a emissão de estímulos musicais. Tanto recepção quanto emissão atravessam todas as áreas da sensorialidade e da psique humana, incluindo o inconsciente. Gainza (1988) identifica em seu trabalho perturbações no canal musical associadas ao fenômeno que Freud (1923) descreveria como transferência. Freud relaciona muito mais a transferência com a prática clínica da psicanálise, ou seja, a transferência enquanto ocorrente entre paciente e psicanalista, ou seja, a transferência, em Freud conceitua-se como a passagem dos objetos de desejo ou rejeição do inconsciente ao próprio psicanalista. Em Gainza (1988,p.82): “[...] O professor idealizado que frequentemente adquire contornos de figura mítica joga ao mesmo tempo o papel de figura persecutória.”. O educador musical, portanto, pode causar ou simplesmente ser alvo de um fenômeno originalmente pertencente às clínicas psicanalíticas. Porém, há muitos traços que nos permitem enxergar esse fenômeno que Jung (1995) aprofunda e nomeia de projeção, voltando-se para as mais diversas figuras, especialmente as figuras familiares, que são as protagonistas tanto da construção quanto da criação de desvios no inconsciente, em especial pela presença dos arquétipos, que são figuras pertencentes ao inconsciente coletivo, e se relacionam intimamente com as características da personalidade humana (Jung, 1995). Em outras palavras, os arquétipos são como personagens de uma história, que realizam diversas ações em nosso inconsciente. Tanto em Jung quanto em Freud, podemos perceber que este fenômeno psíquico gera uma espécie de roda de reações, que tendem a ter seu termo na rejeição, onde se estabelecem os complexos, que são entendidos tanto como problemas ou traumas que desembocam no aparelho inconsciente quanto as estruturas maiores formadas por esses problemas, que por si só geram significativos traços na personalidade. É observável no caso apontado por Gainza (1988, p.83): “Desse modo, a música não funciona como algo autônomo, que é utilizado para expressar sentimentos, mas como um objeto 'catectizado'[...]”. O termo 'catectizado', neste contexto, faz alusão ao objeto musical 'grudado' ao indivíduo, de forma não saudável. A transferência, neste caso , refere-se aos entes familiares mais próximos. É possível associar tais fenômenos aos primeiros anos de vida (GAINZA, 1988), e por tal motivo tende a relacionar-se também com prazeres projetados de diversas formas nas fases de desenvolvimento psicossexual, como Freud (1911) aponta. Remonta-se os prazeres psicossexuais no inconsciente, dentre os quais a música se insere de maneira óbvia como atividade cujo objetivo muito importante é a produção de prazer à psique humana. Tal “catectização” observada por Gainza (1988), revela um evidente conflito entre as instâncias do inconsciente, onde o prazer entra em conflito com a moralidade e a necessidade de aprovação, fazendo com que o canal musical em si esteja de certa forma “obstruído”, e por isso a expressão musical concreta, expressiva e prazerosa tanto para ouvinte quanto para executante não seja completa. Temos aqui que o objeto musical será, inexoravelmente danificado, caso o canal musical de alguma das partes esteja também danificada. Se não for danificado em seu princípio material (no som que sai) será danificado em sua recepção (no som que atinge o indivíduo com o canal musical deficiente).     3.O conteúdo do Inconsciente e sua relação com o canal musical O inconsciente possui algumas caracteristicas a se destacar, para compreendermos a situação do canal musical no momento em que atravessa o mesmo. Sua atemporalidade (a crença de que o inconsciente desconhece ou ignora a métrica temporal) (FREUD, 2010), talvez seja um dos pontos mais discutidos e controversos entre os diversos autores da psicanálise. Se considerarmos como verdadeira essa premissa, certamente perceberemos, como os próprios psicanalistas percebem em sua prática, que as experiências do ser, desde a gestação até a idade em que se encontra, interferem em seu canal musical, e são capazes de criar neste mesmo canal os mais diversos complexos. Em Jung (1995), temos que o inconsciente é muitas vezes de difícil compreensão, por ter em seu conteúdo fatos ou características desfavoráveis ou perigosas, dependendo da maneira como o entendemos e trabalhamos tanto individualmente quanto clinicamente. Tanto Jung (1995) quanto Freud (1905) mostram a capacidade ímpar que o inconsciente possui de nos levar a falhas, chistes (pequenas risadas sem motivo aparente) e até mesmo acidentes. Traumas diversos podem ocasionar problemas diversos no canal comunicativo do indivíduo, podendo gerar problemas dos mais graves aos mais simples (FREUD, 2006). Dai resultam muitos os vícios de aprendizagem, por exemplo. Muitas vezes, falhas persistentes são massivamente trabalhadas no campo da técnica e da execução, e continuarão sendo trabalhadas sem sucesso, visto que a raiz de tal falha reside em estruturas maiores do inconsciente. As estruturas do inconsciente e pré-consciente, em especial o superego (estrutura que luta pela moralidade e submissão das vontades à razão) “lutam”, sem sucesso, para que se estabeleça ordenamento das energias oriundas dos traumas e recalques (conteúdos inadmissíveis pelo consciente e que são instantaneamente armazenados no inconsciente, gerando no mesmo uma espécie de barreira de acesso), ou mesmo para que tais energias não revelem o conteúdo presente no inconsciente (FREUD, 1923). O canal musical, portanto, será tão difícil de ser “limpo” quanto forém mais próximas do inconsciente suas deficiências. A solução, neste sentido, como em tantos outros processos, é promover esforços para que tais complexos possam emergir para o consciente.   3.1.Experiência prática sobre um complexo no canal musical Certa vez recebi uma aluna de piano, portadora de um alto grau de musicalidade, muito evidente em sua afinação para cantar. Uma das primeiras informações que tal aluna me fez saber foi sobre sua atual incapacidade de cantar em grandes públicos, devido à morte de seu pai, que era o principal estimulador e inspirador para sua evolução. Em toda a literatura psicanalítica, encontramos extensa e forte relação entre o pai de sexo oposto e o inconsciente do indivíduo. Os complexos de Édipo e Electra são o ápice de tal relação. Sabe-se que, no caso da menina, é o pai que “desenha” a imagem sexual primária na psicossexualidade. Isso é facilmente explicitado pelos constantes relatos de sonhos eróticos envolvendo as figuras paterna e materna, que constantemente causam desconforto em indivíduos, em qualquer fase da vida (FREUD, 2001). Como primeira experiência, tal aluna foi submetida a uma atividade de improvisação musical ao piano. A improvisação foi escolhida por ser, segundo França e Swanwick (2002), uma das formas mais genuínas de expressão de musicalidade, e portanto, ideal para o início de vários trabalhos em sala de aula, nos vários níveis. Nas primeiras experiências, alguns atos falhos ficaram evidentes. Como se tratava de uma atividade livre de improvisação, mostrava-se claro o perfeccionismo e a auto-cobrança exacerbada desta aluna, que acabava por considerar “erradas” células rítmicas ou frases mais ousadas. Foi solicitado então que esta aluna tocasse de olhos fechados, evocando à mente a imagem de seu pai. Tal mudança na atividade provocou uma experiência muito clara de catexia, onde conteúdos do inconscientes, codificados, de certa forma, de forma musical, “saltaram” para o piano. Como indica França (2003, p.2): “[...] a música oferece uma variedade de objetos simbólicos de pensamento [...]”, ou seja, signos que mudam de lugar a todo momento, ora agindo como significante, ora agindo como significado. Portanto, observar a estrutura musical como um objeto simbólico de fatores presentes na mente humana nos oferece, com facilidade, a possibilidade de investigar as relações entre o canal musical e o inconsciente. O que houve de inconsciente em tal experiência não foi explicitado, como podemos analisar. Os relatos sobre o óbito do pai eram conscientes na mente da aluna, assim como a tristeza profundas e as diversas implicações da mesma. O produto desta experiência, portanto, foram energias psíquicas, pulsões ('nós' de energia inconsciente) do inconsciente. Os produtos reprimidos, que advém do inconsciente, terminam por se explicitarem no inconsciente tão logo se afastem do representante reprimido (FREUD, 1969). O que foi intencionalmente colocado em questão na atividade foram as emoções, e como as emoções conversam com a expressão musical, o que, certamente, exprimira conteúdos intensos do inconsciente. O que se pode concluir da experiência relatada é que as respostas musicais se relacionam de forma íntima com o inconsciente, e o canal musical que atravessa essa relação carrega a expressão musical de influências, pela própria natureza de seus contornos.   4.O Objeto Musical Internalizado enquanto parte do inconsciente   Os processos internos induzidos pelo som e pela música contribuem para estabelecer um depósito ou arquivo sonoro e musical rico e individual, ao qual denominaremos OBJETO MUSICAL INTERNALIZADO (OMI), que interage com o SUJEITO MUSICAL, do mesmo modo que o OBJETO MUSICAL EXTERNO se relaciona com aquele. (GAINZA, 1988, p.30)   O conceito de Objeto Musical Internalizado, enquanto propriedade da psicologia da música, nos remonta determinadas atividades executadas em sala de aula, onde fica clara a relação do aluno com todo o repertório musical que o mesmo já possui. Por vezes, no entanto, tal “depósito” de experiências musicais inexiste nas lembranças ou na história consciente do indivíduo. É neste momento que observamos a camada do Objeto Musical Internalizado que pertence ao inconsciente. Freud (1974) evidencia a existência de um objeto sexual no inconsciente, formado principalmente pelas relações familiares, em especial com os pais, e desenvolvido ao longo dos tempos. Este objeto é formado por estruturas, mais tarde chamadas de complexos por Jung (1995). Temos, portanto, que o inconsciente se constitui de objetos ou complexos. Independente da terminologia utilizada, o que se conclui, ao colocarmos lado a lado esses termos, é que o inconsciente é formado por estruturas grandes e emaranhadas, muitas vezes não muito discerníveis, que tem influência direta sobre o comportamento do indivíduo. Enquanto objeto inconsciente, o OMI trabalha também por meio de experiências ancestrais, ou seja, tanto experiências oriundas de nossa cadeia evolutiva quanto experiências familiares mais próximas, e isso se torna claro ao perceber que certos traços estilísticos são comuns na expressão musical de qualquer ser humano, que por meio de seu inconsciente coletivo (JUNG, 1995), relaciona toda a cultura humana anterior a ele com os novos estímulos sonoros que produz e frui. Green (1997) já nos alerta sobre a importância da atenção aos fenômenos e materiais sócio-culturais na aula de música, e sobre sua influência em sala de aula. Ao identificar a reação dos adolescentes com padrões musicais diversos, e sua relação de intimidade com a “novidade em música” (GREEN, 1987), percebe-se claramente a influência do inconsciente, mais precisamente da área psicossexual, na atividade musical. Junto com a aproximação ao campo sexual, o afastamento com laços próximos, visando a 'descoberta do mundo' (FREUD, 1920), produzem o fenômeno de busca por novos estilos e formas musicais, o que produz a conexão forte entre jovem e novidade musical, aliada à ideologia própria que se desenvolve no contorno social (VOGT, 2015) .O OMI se move no canal musical, buscando ampliar-se, e a partir dai reafirma-se o desejo de crescimento, inerente ao ser humano. Aliado ao sentimento de frustração presente na sociedade como um todo nos dias atuais (FREUD, 1931), este desejo pelo novo é carregado por uma força opositora de descontentamento, própria da pós-modernidade, o que se encaixa conflito da adolescencia, tão conhecido atualmente. O conflito da adolescência é um conflito existencial. Na educação musical, onde a música genuinamente expressa conteúdos inconscientes de sua forma mais genuína, ou seja, indescritível em linguagens objetivas. A confusão criativa, que cria por si só um espectro de intensidades variadas conforme os anos da puberdade avançam ou regressam, não é, em essência, um problema musical, tornando-se, isso sim, um espelho da tentativa de ordenamento psicológico existente em todas as camadas da mente do indivíduo.   4.1. Implicações na prática pedagógica É uma das tarefas primordiais do educador, entender os afetos humanos que circundam a psique do educando, e agir com compreensão e delicadeza, formando até mesmo laços de afeto com o indivíduo (VAN MANEN,1998). A progressão constante do mal-estar presente na civilização pós-moderna, em paralelo com a própria complexidade do inconsciente, faz nascer a necessidade de uma prática pedagógica voltada para o ser humano em um espectro mais amplo de sua totalidade. O trabalho em educação musical voltado para a sensibilidade, como já postulado por Reimer (2002), reforça a interação entre a própria aula de música e o canal musical, que certamente é uma das prioridades básicas da educação musical. O inconsciente, enquanto gerador de material musical, se torna material fundamental para estudo dos educadores musicais, já que estão preocupados em perceber a música enquanto conteúdo que pulsa da camada emocional do ser. O ensino de instrumentos musicais frequentemente se torna vazio de significados emocionais (SWANWICK, 1994), o que dificulta a interação primordial entre educador e canal musical. No que tange ao desenvolvimento, ou cursus da prática pedagógica, implica dizer que não é possível dar continuidade ao processo de ensino de música enquanto não se conhecer a fundo o educando, e tal conhecimento não é possível sem que haja diálogo no processo pedagógico, especialmente nos primeiros instantes em que se encontram juntos educador e educando, para iniciar o processo de aprendizagem.   5.Conclusão Neste trabalho foram colocadas em discussão as relações entre a teoria psicanalítica e a educação musical. Surge aqui, também, margem para um novo trabalho em psicanálise, orientado pela expressão musical, embora não seja este o objetivo principal. É possível, através da observação da relação entre as teorias psicanalíticas e os comportamentos musicais do educando, perceber refinadas semelhanças e propor soluções alternativas para a resolução de conflitos na aprendizagem. Por fim, conclui-se que é possível ao educador musical valer-se do ferramental teórico das teorias psicanalíticas em sala de aula, desde que o faça com atenção e aliado a um bom conhecimento de tais teorias, para que não hajam graves confusões neste processo. O educador musical que consegue se valer das teorias psicanalíticas, irá consequentemente possibilitar o aprendizado musical aos alunos ditos, tradicionalmente, “sem dom” ou “sem jeito pra coisa”, visto que em muitos desses casos a origem do problema é um canal musical deficiente.   8.Referências Bibliográficas   FRANÇA, Cecília Cavalieri; SWANWICK, Keith. Composição, apreciação e performance na educação musical: teoria, pesquisa, pesquisa e pratica. em Pauta, [s.l], v. 13, n. 21, p.5-41, dez. 2002. Disponível em: <http://www.evertonbackes.com/resources/composição, apreciação e performance na educação musical teoria, pesquisa e prática.pdf>. Acesso em: 24 fev. 2017.   FRANÇA, Cecília Cavalieri. O som e a forma: do gesto ao valor. Ensino de música: propostas para pensar e agir em sala de aula. São Paulo: Moderna, p. 48-61, 2003. Disponível em: <http://ceciliacavalierifranca.com.br/wp-content/themes/cecilia/downloads/textos/capitulos/Som_forma.pdf>. Acesso em 25 de fevereiro de 2017. FREUD, Sigmund. A história do Movimento Psicanalítico: Artigos sobre Metapsicologia e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1969.   FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos, 1900. Rio de Janeiro: Imago, 2001.   FREUD, Sigmund. Além do princípio do prazer, psicologia de grupo e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1920.   FREUD, Sigmund. Cinco lições de psicanálise. São Paulo: Abril Cultural, 1974.   FREUD, Sigmund. Conferências introdutórias sobre psicanálise: Volume XV. 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Disponível em: <http://www.abemeducacaomusical.com.br/revistas/revistaabem/index.php/revistaabem/article/view/483/393> Acesso em: 22 mai 2017.   JUNG, Carl Gustav.. Psicologia do Inconsciente. 23. ed. Petrópolis: Vozes, 1971.   REIMER, Bennett. A Philosophy of Music Education: Advancing the Vision. 2002.   SWANWICK, Keith. Ensinando Musica Musicalmente (Portuguese Translation of Teaching Music Musically). Moderna, 2003.   SWANWICK, Keith. Ensino Instrumental Enquanto Ensino de Música. Atravez - Associação Artistico Cultural, São Paulo, v. 1, n. 1, p.1-5, abr. 1994. Tradução de Fausto Borém de Oliveira e Revisão de Maria Betânia Parizzi. Disponível em: <http://server1.docfoc.com/uploads/Z2016/01/21/pplxogTAiF/ac64c6006c44aadbeb88a534150012b1.pdf>. Acesso em: 24 fev. 2017.   VAN MANEN, Max. El tacto en la enseñansa: El significado de la sensibilidad pedagógica. Barcelona: Paidós Educador, 1998.   VOGT, Jürgen .Music Education and Ideology Critique.2015. 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